Aprendendo matemática
Encontros e relações têm um quê de interseção. Fala-se muito de união e desunião nas relações; pouco se fala da interseção, desse corte que cada ser humano oferece ao se aproximar, desse eixo duplo construído a partir do que instintivamente se enlaça, do produto simultâneo. Da mesma forma, as relações são marcadas pela aritmética mais vulgar. Vivemos de somar, subtrair, multiplicar e dividir o tempo inteiro. Seja reconhecendo, em meio ao nosso processo constante de transformação, o que o outro nos adiciona; seja por conta de uma atitude violenta que subtraia uma virtude preciosa, ainda que temporariamente; pela distância ou tempo triplicando uma saudade; pelo algo se partindo, às vezes de modo exato, às vezes deixando restos.
Para além da aritmética, razão e proporção parecem, nos dias de hoje, apontar para uma álgebra esquisita. Alguém dá um tapa e recebe em troca um tiro no olho. Isso talvez pudesse ser chamado de desrazão e desproporção, no pior sentido dos termos, mas evidencia a deformação matemática preferida de nossos tempos. Logo após, no ranking algébrico, as equações formuladas em planejamentos sem delta nem raiz: não resolvem “x” algum de questão nenhuma, apenas revelam a incapacidade humana diante do que permanece incógnita.
Já na geometria, cabe toda a abstração que dá contornos à beleza e a incursões subjetivas. Nela residem a angulação dos pontos de vistas e as estruturas, mais ou menos flácidas, das obras de arte. Também foi a partir de um “sopro” geométrico que o universalismo platônico despontou com o ideal de bem comum, criando um dos alicerces da filosofia política no mundo. Em Timeu, o artesão divino busca pôr ordem à desordem que naturalmente a geometria do universo propõe. Para Platão, de modo análogo, a Justiça, resultante de um ordenamento racional, só se manifestava se o governante incorporasse ao seu espírito a virtude do Bem, visto como eterno e absoluto. Apenas o governante que procedesse dessa forma teria a capacidade de ser justo e proporcionar o bem comum.
Na probabilidade está o fascínio pela sorte, que gera o gosto pelo risco. Arriscar-se traduz um imenso desejo por sorte. A exposição ao perigo traz, ao menos no plano mental, o sofrimento como resultado mais provável. Em um exemplo rude, trepar sem camisinha é correr o risco de se contaminar; por outro lado não há certeza de contaminação e muitos se arriscam contando com a sorte. Existem também formas mais brandas de experiência acerca do provável como, por exemplo, jogar na loteria. Apostar na mega-sena, ganhando-se ou não o prêmio, não acarreta nenhum tipo de insegurança para o apostador. Talvez porque o bilhete milionário represente a sorte grande, e o perigo guarde relação com sortes nanicas.
Marcadores: Camada fina de metal sobre o espelho, Crônicas
3 Comentários:
Lembrei-me de uma parte do filme "Um beijo roubado" do diretor chinês que só filme de fora dos ambientes (coisa que só percebi na segunda vez que assisti). De qualquer forma, a parte que me lembrou foi a do personagem que joga poquer. Sei lá... esse negócio de arriscar e ter a vida calcada nesse êxtase que toma conta do corpo, da mente, de tudo. Somando, multiplicando sensações... Eu não sou muito de matemática, mas adoro somar pipoca com cinema e subtrair uns quilinhos a mais da minha barriguinha... rs
beijos daqui...
Meu Deus, fazia tempo que eu não encontrava um blogue tão criativo.
Muito, muito bom. Tá de parabéns.
;D
Rafael,
agradeço a sua presença aqui.
Um grande abraço pra ti.
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