sábado, abril 07, 2007

Na boléia do sol

Desde pequeno eu gosto do sentido do giro. Quando ia para um parque de diversões, um dos brinquedos que mais gostava era o carrossel. Às vezes, só de me ver rodando, eu me sentia tonto e pensava que a Terra entontecia por girar em torno do Sol. Mas como ela também gira em torno de si mesma feito um pião, e eu não via pião ficar tonto, acabava largando a minha conclusão na sela do cavalo. Teve um dia em que caí do carrossel da escola e lasquei a testa no muro. Achei que o planeta era achatado nos pólos justamente para não dar esses vacilos.

A mente, também não é de hoje, vive em ciranda de idéias. Inventa circuitos oblíquos para o roça-roça do juízo. Define arcos onde as noções a cada ano precedem, desenham triângulos de intenções e lembranças, formulam desígnios que fortalecem o braço do pensamento. Ela é a coragem de viver e morrer a todo instante por ter esquecido a finalidade, o alcance e a meta. Quer só o movimento; apenas deseja não saber onde está um porto. A única exigência é muita água para beber.

A sede do corpo também conta para a roda. A grávida com sua barriga de lona de circo acaba de evocar a minha simpatia, mesmo tendo nariz de botelha e bochechas vincadas. Dentro dela a redondeza do espanto dá cambalhotas, remexe em ternas reviravoltas, faz acrobacias de riso, piruetas que mais ali um pouco me lembram a bailarina em sua dança e labuta. Os passos da bailarina correm como o curso de um rio roliço, cheio de espirais e voragens.

Então é bom saber que o Sol não é fixo. Ele, como a Terra, gira em torno de si mesmo. E vai correndo encontrar a constelação de Hércules. E rodeia o centro de sua galáxia até que se faça o ano solar. Já a Via Láctea viaja a 600 milhões de km/h para beijar as faces do Cão, que é outro grupo estelar a riscar o espaço e pôr linhas de grandeza imaginariamente concretas na incessante geometria do universo. Meus dedos teclam agora a carona nessa intricada lógica orbital e gravitacional. Eles escrevem a delícia de fazer todo esse movimento com a bunda sentada na cadeira.

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15 Comentários:

Às 8:08 AM , Anonymous Anônimo disse...

Eu fiquei até tonta de tanto giro.. rsrs

beijo

 
Às 10:56 AM , Anonymous Anônimo disse...

Gutão.. bom texto.. provoca a vertigem gostosa do giro...

Gostei muito da parte dos giros cósmicos e da Via láctea que vai beijar a face do Cão. A dimensão destas coisas do infinito é deixar
qualquer um intrigado e meio tonto.

Abraço forte... (tentarei aparecer com mais frequência entre as pausas do mestrado)

 
Às 5:11 PM , Anonymous Anônimo disse...

Olá meu rapaz, passando apenas pra dizer que gostei do seu estilo!

Voltarei novamente.

Agora vou dar uma lida nos outros posts.

Abraço

 
Às 9:22 PM , Anonymous Anônimo disse...

Lá vamos nós a correr pelo cosmos sem nos darmos conta... maravilha!

 
Às 6:45 AM , Blogger Guto Melo disse...

Grande Thiago, presença ilustre no merclux. Saudade de você irmão. Apareça mais vezes. Terno abraço.

 
Às 8:54 PM , Blogger .Fer. disse...

Gostei. Gostei mesmo.
Gostei da visão giratória das coisas que acaba por fazer a gente se prender ao texto!

Beijo grande!

 
Às 4:01 AM , Blogger SV disse...

Pelo que vejo estivemos conectados em nossos posts: Boléia do sol e Currupiu. Tudo a ver.

Um abraço!

Sílvio Vasconcellos

 
Às 5:54 AM , Blogger Raimundo Neto disse...

Sempre bom andar, andar, girar, e parar aqui!

Mais um texto com excelência!

 
Às 6:34 AM , Anonymous Anônimo disse...

Bom gostei da analogia poema, ou poema anologia, apesar de não gostar dessas coisas de fisica, ficou legal e fiquei eu pensando que o mundo gira gira, o cara que escreveu alice no páis das maravilhas morreu, mas vc ta aí, rsrsrsrs,abraço

 
Às 7:30 AM , Blogger Jane Malaquias disse...

E Buda sentou-se no ponto imóvel sob a árvore da iluminação...

 
Às 8:17 AM , Anonymous Anônimo disse...

O texto é muito bom. Muito bem escrito.
O círculo vicioso que nossa vida tem. Ou pode ter. Alguns lidam bem com isso. Como você.
Abração

 
Às 3:48 PM , Blogger Luma Rosa disse...

E na órbita das cadeiras viajou pelo tempo de parques, carrossel, pião e cavalos.
E me fez lembrar da música de Saulo Laranjeira e Tuca Graça

" Gira o sol,
Gira a lua
Roda mundo
Roda pião
Gira o coco
Na beira do mar

Êh, gira o coco
Na beira do mar
Na beira do mar,
Girou, girou, girou

Na rodeira do tempo andei
Na vereda do sol cirandei

Cirandá, cirandá... Cirandei...

Gira o sol
Gira a lua
Roda mundo
Roda pião
Gira o coco
Na beira do mar

Gira o coco
Na palma da mão
Gira o coco
Na palma do pé

Bate o coco
Na palma do coco
Na palma da mão
Na palma do pé"
(Gira o côco)

Boa semana! Beijus

 
Às 12:22 PM , Blogger Noeli da Fonseka disse...

Texto cativante.

Lembrei do círculo das letras da máquina de escrever IBM, lembrei do baleiro no bar da esquina...

...Ouroboros...

B:)a Semana!

 
Às 8:58 PM , Blogger Lidiane disse...

Girar é comigo.
E gosto de ler você.

 
Às 10:46 PM , Blogger Guto Melo disse...

Obrigado Lidiane!

 

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