Na boléia do sol
Desde pequeno eu gosto do sentido do giro. Quando ia para um parque de diversões, um dos brinquedos que mais gostava era o carrossel. Às vezes, só de me ver rodando, eu me sentia tonto e pensava que a Terra entontecia por girar em torno do Sol. Mas como ela também gira em torno de si mesma feito um pião, e eu não via pião ficar tonto, acabava largando a minha conclusão na sela do cavalo. Teve um dia em que caí do carrossel da escola e lasquei a testa no muro. Achei que o planeta era achatado nos pólos justamente para não dar esses vacilos.
A mente, também não é de hoje, vive em ciranda de idéias. Inventa circuitos oblíquos para o roça-roça do juízo. Define arcos onde as noções a cada ano precedem, desenham triângulos de intenções e lembranças, formulam desígnios que fortalecem o braço do pensamento. Ela é a coragem de viver e morrer a todo instante por ter esquecido a finalidade, o alcance e a meta. Quer só o movimento; apenas deseja não saber onde está um porto. A única exigência é muita água para beber.
A sede do corpo também conta para a roda. A grávida com sua barriga de lona de circo acaba de evocar a minha simpatia, mesmo tendo nariz de botelha e bochechas vincadas. Dentro dela a redondeza do espanto dá cambalhotas, remexe em ternas reviravoltas, faz acrobacias de riso, piruetas que mais ali um pouco me lembram a bailarina em sua dança e labuta. Os passos da bailarina correm como o curso de um rio roliço, cheio de espirais e voragens.
Então é bom saber que o Sol não é fixo. Ele, como a Terra, gira em torno de si mesmo. E vai correndo encontrar a constelação de Hércules. E rodeia o centro de sua galáxia até que se faça o ano solar. Já a Via Láctea viaja a 600 milhões de km/h para beijar as faces do Cão, que é outro grupo estelar a riscar o espaço e pôr linhas de grandeza imaginariamente concretas na incessante geometria do universo. Meus dedos teclam agora a carona nessa intricada lógica orbital e gravitacional. Eles escrevem a delícia de fazer todo esse movimento com a bunda sentada na cadeira.
Marcadores: Camada fina de metal sobre o espelho, Crônicas despenteadas
15 Comentários:
Eu fiquei até tonta de tanto giro.. rsrs
beijo
Gutão.. bom texto.. provoca a vertigem gostosa do giro...
Gostei muito da parte dos giros cósmicos e da Via láctea que vai beijar a face do Cão. A dimensão destas coisas do infinito é deixar
qualquer um intrigado e meio tonto.
Abraço forte... (tentarei aparecer com mais frequência entre as pausas do mestrado)
Olá meu rapaz, passando apenas pra dizer que gostei do seu estilo!
Voltarei novamente.
Agora vou dar uma lida nos outros posts.
Abraço
Lá vamos nós a correr pelo cosmos sem nos darmos conta... maravilha!
Grande Thiago, presença ilustre no merclux. Saudade de você irmão. Apareça mais vezes. Terno abraço.
Gostei. Gostei mesmo.
Gostei da visão giratória das coisas que acaba por fazer a gente se prender ao texto!
Beijo grande!
Pelo que vejo estivemos conectados em nossos posts: Boléia do sol e Currupiu. Tudo a ver.
Um abraço!
Sílvio Vasconcellos
Sempre bom andar, andar, girar, e parar aqui!
Mais um texto com excelência!
Bom gostei da analogia poema, ou poema anologia, apesar de não gostar dessas coisas de fisica, ficou legal e fiquei eu pensando que o mundo gira gira, o cara que escreveu alice no páis das maravilhas morreu, mas vc ta aí, rsrsrsrs,abraço
E Buda sentou-se no ponto imóvel sob a árvore da iluminação...
O texto é muito bom. Muito bem escrito.
O círculo vicioso que nossa vida tem. Ou pode ter. Alguns lidam bem com isso. Como você.
Abração
E na órbita das cadeiras viajou pelo tempo de parques, carrossel, pião e cavalos.
E me fez lembrar da música de Saulo Laranjeira e Tuca Graça
" Gira o sol,
Gira a lua
Roda mundo
Roda pião
Gira o coco
Na beira do mar
Êh, gira o coco
Na beira do mar
Na beira do mar,
Girou, girou, girou
Na rodeira do tempo andei
Na vereda do sol cirandei
Cirandá, cirandá... Cirandei...
Gira o sol
Gira a lua
Roda mundo
Roda pião
Gira o coco
Na beira do mar
Gira o coco
Na palma da mão
Gira o coco
Na palma do pé
Bate o coco
Na palma do coco
Na palma da mão
Na palma do pé"
(Gira o côco)
Boa semana! Beijus
Texto cativante.
Lembrei do círculo das letras da máquina de escrever IBM, lembrei do baleiro no bar da esquina...
...Ouroboros...
B:)a Semana!
Girar é comigo.
E gosto de ler você.
Obrigado Lidiane!
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