Toda vez que eu visto um terno e uma gravata para ir ao trabalho, minha mulher diz que estou bonito e elegante. Eu respondo com um sorriso insosso, pois sei que o Congresso Nacional me espera, com sua feiura e má energia. Deputados, conceitualmente, são representantes do povo. No Congresso, não se pode transitar em determinados lugares sem o tal terno e a tal gravata, vestimenta que está longe de nos representar. Nos fins de semana, o interfone toca... Gente pedido um calçado ou aquela peça surrada que está encalhada no guarda-roupa. No Congresso, sinto que estou fora da realidade, e isso me perturba.
O corredor que dá acesso às comissões é repleto de gente sem brilho no olhar, com pose de séria e tiques formais. Toda quarta-feira, dia em que grande parte das comissões delibera, o grande corre-corre simula pressa, já que toda aquela correria geralmente é para retardar a tramitação das proposições, num pedido de vista ou num requerimento para retirada de pauta. Sim, a culpa, como se costuma dizer, não é só dos parlamentares, mas de diversos outros atores que trabalham para o Congresso não andar. Inclusos governo, assessores parlamentares, representantes de agentes de um determinado setor – o lobby e o anti-lobby. Tudo bem, a maioria dos projetos de lei é um porcaria, mas isso essencialmente não é levado em conta, pois no final o lobby acaba vencendo.
Por isso, meus caros, toda quarta-feira é uma quarta feia. Se a reforma ortográfica fez a feiura perder o acento, no Congresso ela continua bem acentuada. E eu lá no meio, de terno e gravata, respirando perfume barato, com um sono que parece uma pedra na alma, como um elegante adormecido.
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